O projeto da Hidrelétrica de Tabajara prevê a construção de uma barragem no rio Ji-Paraná (também chamado de rio Machado), em Machadinho D’Oeste (RO). O Ministério Público Federal (MPF) vem acompanhando o processo de licenciamento desse empreendimento. O órgão analisou os estudos e o relatório de impacto ambiental e verificou que vários pontos ainda não foram apresentados com a profundidade que um empreendimento do porte de uma hidrelétrica necessita.
Por esta razão, o MPF expediu uma recomendação para que o Ibama não emita nenhuma licença ambiental até que o empreendedor – a Eletrobrás – faça estudos complementares sobre 11 pontos. A recomendação foi enviada também para a Eletrobrás para que, no prazo máximo de 30 dias, complemente os estudos de impacto da barragem e seu reservatório (lago formado pela água represada após a construção da barragem no rio).
A Eletrobrás deve identificar todas as famílias na área de abrangência da hidrelétrica, com descrição das atividades econômicas e sociais que podem ser alteradas ou destruídas.
Segundo o MPF, os estudos do meio físico, do meio biótico (relativo à vida e aos seres vivos) e do meio socioeconômico não apresentaram conexões entre si. Não se relacionou, por exemplo, os estudos da flora e da fauna com as comunidades – alimentação, uso medicinal, artesanato, pesca etc. “O relatório dos estudos mais se assemelha a um documento de publicidade positiva do empreendimento do que a uma avaliação de impactos, fazendo crer que os impactos são poucos e restritos à Vila Tabajara”, afirma a procuradora da República Gisele Bleggi.
Ela acrescenta que a população de Machadinho D’Oeste precisa ser esclarecida de que o suposto boom econômico na região por causa da construção de uma hidrelétrica é temporário e seguido por um colapso social, econômico e ambiental, não podendo ser confundido com desenvolvimento econômico da região.
O MPF indica que o aumento populacional de Machadinho D’Oeste previsto nos estudos possivelmente está subestimado e pode chegar a até 35 mil pessoas no município, mais que o dobro do atual. Em grandes empreendimentos, o número de pessoas que migram em busca de emprego é maior do que o número real de vagas. Nos estudos, a expectativa de empregos gerados baseou-se no período de pico das obras, o que dura apenas alguns meses. Com o aumento populacional exagerado, os serviços públicos de saúde, educação e segurança pública podem ser muito prejudicados, pois não são absorvidos pelo empreendedor.
Atualmente Machadinho já é o município rondoniense com a mais alta taxa de homicídio e está no ranking das cidades mais perigosas do país, com causas relacionadas à disputa por terra, extração ilegal de madeira e garimpo. Com a hidrelétrica, é esperado um aumento da violência.
Índios isolados – A perícia do MPF verificou que os estudos e o relatório de impacto da hidrelétrica não citam as coordenadas geográficas do reservatório. A área alagada pode estar subdimensionada, ou seja, menor que a real.
A Eletrobrás já admitiu ao Ibama que a área que será alagada não é de 55,7 quilômetros quadrados, como foi informado inicialmente, mas de 82,13 quilômetros quadrados. Os locais que não foram incluídos nos estudos são justamente onde há referências a índios isolados: região de igarapés (córregos) que estão a montante (acima) da futura barragem. Pelos estudos, após a construção da barragem, esses igarapés irão transbordar e essa região vai formar os braços do reservatório.
Impactos cumulativos – O MPF também recomendou que sejam indicadas as coordenadas geográficas dos demais empreendimentos conjugados à futura hidrelétrica: o traçado dos 230 quilômetros da linha de transmissão que conduzirá energia até Ji-Paraná, a pavimentação da rodovia RO-257, o terminal graneleiro e o prolongamento da BR-080. Na mesma bacia hidrográfica há também duas Pequenas Centrais Hidrelétricas – PCHs Jaburu e Machadinho – que não foram consideradas nos estudos de impacto, cujos danos devem ser analisados em conjunto e de forma cumulativa.
Cerca de 70 quilômetros da rodovia RO-133 terão alterações de acesso e travessia para fazer o caminho entre a Vila Tabajara e a localidade Dois de Novembro. Para o MPF, essa “nova estrada” pode aumentar atividades ilícitas, como a caça, o tráfico de animais silvestres, desmatamento, extração ilegal de madeira da região, representando ameaça aos índios isolados, à Reserva Extrativista Rio Preto Jacundá e às três comunidades extrativistas que vivem nela – Jatobá, Jatuarana e Cabeça de Boi.
Além disso, a previsão de construção de uma ponte ligando uma margem à outra do rio Machado pode impactar o Parque Nacional Campos Amazônicos e as terras indígenas Tenharim-Marmelos e Jiahui.
Na recomendação, o MPF pede que todos esses pontos sejam esclarecidos para que se verifique se há viabilidade ou não da construção da barragem no rio Ji-Paraná, bem como as medidas para prevenir, minimizar ou compensar os eventuais danos.