Caso é investigado pela Polícia Federal. Agressões teriam ocorrido após a morte de uma criança indígena atendida pela médica
A médica Maria Vanessa, de 38 anos, ficou traumatizada após ser agredida na Terra Indígena Yanomami, informou o marido dela, Josimar Ribeiro, nesta quinta-feira (23). Os ataques teriam ocorrido após a morte de uma criança indígena que foi atendida pela profissional. A Polícia Federal em Roraima investiga o caso.
Conforme o marido, a médica precisa ser dopada o tempo todo para aguentar as dores e já chegou a acordar assustada achando que seria agredida outra vez. A mulher teve os dois braços quebrados e sofreu um ferimento na cabeça. Ela continua internada no Hospital Lotty Iris, em Boa Vista.
“Ela não tem condições físicas e nem psicológicas para voltar à região. O trauma foi muito grande. Até hoje, ela ainda tem dificuldades para dormir e está à base de remédios para pegar no sono. Ontem, ela ouviu um barulho no hospital e acordou desesperada achando que os indígenas queriam atacá-la de novo”, disse Ribeiro.
Vanessa trabalhava no Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami (Dsei-Y). O caso ocorreu na região do Xitei, em Alto Alegre, ao Norte de Roraima. A distância entre o município e a capital é de a 72.46 km. Agora, o marido disse que aguarda a recuperação para pedir transferência para outro estado.
Procurada, a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) informou que tomou conhecimento, na última sexta-feira (17) “sobre a suposta agressão física sofrida por uma médica da Equipe Multidisciplinar da Saúde Indígena”.
A médica passou por duas cirurgias nos braços e se prepara para operar o braço esquerdo mais uma vez. Ela perdeu muito sangue e a família afirma que houve demora no socorro, uma vez que ela foi agredida no último dia 15 e levada da região indígena a Boa Vista cerca de 24 depois.
Segundo o advogado da vítima, Glaucinei Mesquita de Campos, ela teria sido atacada por 10 indígenas. A informação contraria o Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami e Ye’kuana (Condisi-Y), que informou que há quatro suspeitos das agressões.
“Eles só pararam de agredi-la depois de um tempo. Ela ainda se fingiu de morta, mas continuaram a bater nela e não deixaram ninguém socorrê-la. Um deles, inclusive, chegou a dizer que estava feliz com o que tinha feito”, explicou Josimar.
Ainda segundo Josimar, agora, eles vão entrar com um pedido de afastamento para tratamento de saúde da profissional.
Morte da criança Yanomami
Conforme o advogado de Vanessa, a profissional fez um procedimento de retirada de bicho de pé – pequeno parasita que entra na pele e comum em zonas rurais – em uma criança da comunidade e teve um bom resultado.
Então, outra família pediu que fosse feito procedimento em outra criança. Conforme o advogado, o parasita foi retirado dos dois pés e região das nádegas do indígena, que morreu após o procedimento. Ele disse que não há como afirmar se houve “erro médico” e que ainda não foi realizada a perícia no corpo.
“Ela começou com o primeiro pé, aplicou a medicação, que seria um analgésico para a criança não sentir dor e quando foi à tarde, que ela foi fazer o procedimento no outro pé, foi que ocorreram as complicações”, informou o advogado.
Segundo o presidente do Condisi-Y, Júnior Yanomami, que foi até a comunidade apurar a ocorrência, a família afirmou que a criança “não tinha nada”, mas foi chamada pela médica para tirar “bicho de pé”.
“Conversei com um dos irmãos, ele declarou que fizeram isso e reconhece que erraram. Eles fizeram no momento de raiva, porque o irmão morreu e a mãe estava lutando, chorando. Mas isso não se justifica. Nós, representantes, repudiamos total contra isso. Toda a comunidade está muito chateada com a família”, disse Junior Yanomami.
Ainda conforme o relato da família, durante o procedimento, a criança perdeu muito sangue e quando já estava quase sem vida foi levada para a comunidade, que fica há dez minutos do posto de saúde. Os quatro irmãos da criança teriam ficado revoltados e responsabilizado a médica pela morte.
Nos próximos dias a médica deverá depor, por meio de videoconferência, para esclarecer os fatos à Delegacia de Polícia Civil de Alto Alegre.